30/07/2018

Podemos confiar nos símbolos cruelty-free?


Com o aumento da sensibilização contra os testes em animais, cada vez é mais comum encontrarmos o famoso logótipo do coelhinho nos rótulos das embalagens. No entanto, será que podemos verdadeiramente confiar nesse e noutros símbolos similares? Ao longo deste artigo irei explicar a resposta com todos os detalhes necessários para a esclarecer, bem como sanar outras dúvidas igualmente recorrentes dentro do universo cruelty-free.


TESTES EM ANIMAIS: UMA BREVE INTRODUÇÃO

Porque devemos preferir marcas e produtos não testados em animais?

Os testes realizados em animais são cruéis, desnecessários e acabam por ser financiados quando compramos produtos de empresas que insistem nessa prática obsoleta. Geralmente são testes para calcular o nível de toxicidade, cujas substâncias são aplicadas nos animais por injecção, inalação, ingestão forçada, contacto dermal e contacto ocular.
Está irrevogavelmente comprovado que os animais têm a capacidade de sofrer, pelo que insistir em objectificá-los para as nossas conveniências é absolutamente errado. Ademais, existem inúmeros métodos alternativos e que são tão ou ainda mais eficazes do que as experiências com animais.


A QUESTÃO DOS SÍMBOLOS NOS RÓTULOS

Podemos confiar nos símbolos que encontramos nos rótulos, ou se neles está escrito not tested on animals?

Infelizmente, a resposta é não por diversos motivos:

A consciência ética ligada à procura por produtos cruelty-free é uma das artérias do movimento vegano. Nos últimos anos, temos presenciado uma cooptação impiedosa do veganismo pelo capitalismo, o que o reduz a um mero nicho de mercado. Tal fenómeno provocou sérias alterações à outrora definição sólida sobre o que é um produto cruelty-free. Antes, era bastante simples: se a empresa-mãe permite testes em animais em alguma circunstância (através de fornecedores, de terceiros, vendendo em locais que requerem testes, etc.), nenhum produto proveniente dela é cruelty-free.

Todavia, actualmente encontramos marcas que pertencem a empresas que testam em animais a ostentar o selo cruelty-free – isto porque as ONG's detentoras dos selos oficiais passaram a integrar essas marcas, promovendo uma imagem mercantilista e altamente reducionista da luta pela libertação animal. Eis alguns exemplos:

A Dove e a Herbal Essences foram certificadas pela PETA, sendo que ambas pertencem a empresas que testam em animais (Unilever e Procter & Gamble, respectivamente). Além disso, continuam a ser vendidas na China, que, apesar das graduais mudanças na sua política de testes em animais, os mesmos continuam a ocorrer.

Já a Leaping Bunny concedeu o selo à Garnier, cuja empresa-mãe é a L'Oréal, uma das gigantes da cosmética que mais testa em animais e que, além de também ter inúmeras marcas comercializadas na China, não garante que os fornecedores não testem animais.

Como se este problema não fosse suficiente, existem símbolos que não são certificados (os chamados selos falsos): além de serem inúmeros, tanto são utilizados por empresas que testam em animais como também por empresas que não testam em animais, o que gera bastante confusão.

Por fim, também há muitas empresas que não usam qualquer selo, incluindo as que não testam em animais em nenhum processo.


O que fazer?

Todas as circunstâncias que mencionei acima fazem com que a nossa procura por produtos cruelty-free, quando focada essencialmente nos selos, seja diminuída abruptamente e, também, propensa a equívocos.

Por esse motivo, a minha recomendação é não confiar em nenhum selo ou, pelo menos, não recorrer aos devidos enquanto guia principal. Eis algumas dicas simples:

🐇 Pesquisem primeiro pela empresa. Uma empresa tem várias marcas, pelo que procurar a partir dela facilita muito mais o processo do que ver as marcas uma a uma. Por exemplo, a Unilever testa em animais: com essa informação só precisam de procurar pela empresa no rótulo quando estiverem a comprar algum produto.

🐇 Procurem por listas cruelty-free. É um dos passos mais arriscados, tanto por haver listas desactualizadas como pelo significado de cruelty-free ser agora subjectivo e, por isso, diferir de pessoa para pessoa. Isso resulta numa discrepância que podemos encontrar nas várias listas existentes: enquanto algumas organizações, grupos e bloggers consideram cruelty-free certos produtos e/ou marcas que pertencem a empresas que testam em animais, outras rejeitam essa premissa. No meu blogue, posso garantir que partilho exclusivamente marcas que comprovaram estar completamente desligadas de testes em animais, seja de forma directa ou indirecta: para vê-las só precisam de aceder aqui.

🐇 Prefiram marcas nacionais e artesanais. Cosméticos feitos à mão, de pequenos negócios, são isentos de testes em animais. Nós possuímos imensas marcas com produtos de boa qualidade e que se destacam por serem sustentáveis. Acedam às listas cruelty-free do blogue e vejam a de marcas portuguesas.

🐇 Sejam a voz daqueles que continuam a ser silenciados à força. Descobriram que um dos vossos cosméticos preferidos é testado em animais? Nos supermercados locais não conseguem encontrar opções cruelty-free? Mostrem o vosso descontentamento. Requeiram mudanças. Contactem a empresa/marca e as grandes superfícies comerciais.

Mesmo assim, caso desejem orientar-se a partir dos símbolos, estas são as etapas que podem efectuar:

1. Reconhecer os únicos selos certificados pelas duas ONG's. São elas a Cruelty-Free International e a PETA:

2. Se o produto possui um dos logótipos, verifiquem a sua autenticidade procurando pela marca do produto no site da organização. Abaixo, seguem os links dos bancos de dados das ONG's:


Se o produto possui outro símbolo que não um dos acima ilustrados, significa que é falso/não é certificado. Se o produto possui o símbolo de uma dessas organizações mas a empresa/marca não surge no banco de dados respectivo, significa que está a ser usado sem permissão.

3. Complementem a vossa pesquisa. Tendo em conta que estas organizações têm marcas envolvidas em testes com animais, averiguar fora delas é uma mais-valia. Como referido acima, há grupos e particulares que criam e facultam listas cruelty-free: acrescentem-nos à vossa pesquisa e procurem por blogues, sites, fóruns, etc., dando preferência a trabalhos actualizados e que apresentam informação credível e pormenorizada.


Que perguntas devo colocar a uma empresa/marca?

Does your company test on animals, either for finished products or ingredients?
A vossa empresa testa em animais, quer para produtos acabados ou ingredientes?

Do your suppliers test on animals?

Os vossos fornecedores testam em animais?

Does your company hire or allow third parties to test on animals on your behalf?

A vossa empresa contrata ou permite que terceiros testem em animais?

Are you owned by a parent company that tests on animals?
Pertencem a uma empresa-mãe que testa em animais?

Do you test on animals where required by law?

Testam em animais quando requerido por lei?

Are your products sold in mainland China?

Os vossos produtos são vendidos na China?

Se não receberem resposta, ou a empresa responder insatisfatoriamente, é preferível evitar as suas marcas e priorizar outras comprovadamente cruelty-free.


Cruelty-free é o mesmo que vegan?

Não. Cruelty-free abrange todo e qualquer produto não testado em animais, mas não é indicador de que o mesmo produto seja isento de ingredientes de origem animal. Um produto vegano, para além de ser cruelty-free, não tem ingredientes provenientes de animais.

Infelizmente, o termo vegano” está a ser cada vez mais usado para classificar um produto sem ingredientes de origem animal, mesmo quando a marca/empresa desse produto é testada/testa em animais. No entanto, o veganismo não rejeita somente o consumo e o uso de ingredientes de origem animal, tendo em conta que visa excluir, sempre que possível, todas as formas de exploração animal incluindo os testes em animais.


Um produto vegano é biológico e natural?

Com o surgimento de mais marcas veganas e sustentáveis, cada vez é mais fácil encontrar itens que são tanto veganos como biológicos e também naturais. Contudo, há imensos produtos veganos que não são biológicos e/ou naturais e possuem ingredientes sintéticos. O contrário também aplica-se: há produtos biológicos e naturais que não são veganos, sendo que alguns (pasmem-se!) não são cruelty-free.


Ser um consumidor mais ético pode parecer atribulado, mas com os passos certos é totalmente possível e acaba por tornar-se fácil com o hábito. Pesquisar por produtos cruelty-free não custa nada: já ser alvo de testes atrozes custa. E muito. E essa triste realidade é o suficiente para nos motivar a fazer compras mais conscientes.

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Procuram por marcas e produtos cruelty-free? Comecem por aqui:

Lista de higiene e cosmética de marcas que testam ou que não testam, encontradas em supermercados
Lista de limpeza de marcas que testam ou que não testam, encontradas em supermercados


Sites e blogues que aconselho: